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DIA #16: HELSINGOR, DINAMARCA, ETAPA 2019, EXTREMOS DO MUNDO

Atualizado: 19 de ago. de 2021


Estava me sentindo desconfortável em Copenhagen. Dirá você, puxa, uma cidade tão moderna e tão cheia de atrativos? Sim e acrescento, sempre quis conhecer Copenhagen. Entretanto, tive uma sensação parecida com a de Hamburgo. Um certo mal estar. O hotel que fiquei, aquelas pessoas, tudo muito impessoal. Além disso, sonhei com a minha mãe e toda vez isso mexe comigo. A cidade é fantástica, sem dúvida, moderna, cheia de museus e galerias de arte, mas algo dentro de mim fez-me pular da cama às cinco horas da manhã de hoje. Todos dormiam no albergue enquanto tentava juntar minhas coisas espalhadas para poder partir. Confesso que uma saída um tanto melancólica e, assim, nos primeiros quilômetros, buscava razões lógicas para tal.


O desafio de hoje era tranquilo, 51 km até Helsingør, a famosa cidade do castelo de Kromborg, imortalizado por Shakespeare, em Hamlet.


Aos poucos, por ciclovias super estruturadas, fui deixando o centro urbano e entrando em uma zona rural. Haras e fazendas começaram a fazer parte da paisagem. Ciclovias cortavam parques, bosques e caiam em áreas rurais. Numa delas, uma mistura de fazenda e parque do outro lado. Algo lindo, nunca tinha visto, parei para fotografar e admirar; meu humor começava a melhorar.


De repente, um susto. Eis que surge um camarada de bike ao meu lado. Um sujeito um tanto esquisito que começou a conversar comigo. Perguntas tradicionais, aonde ia, de onde vinha. Ele se dizia padre que trabalhava num monastério, embora não estivesse vestido à caráter. Num momento, olhou para mim e me perguntou se queria acompanhá-lo ao tal monastério onde trabalhava. Achei toda a história muito estranha, um monastério naquele lugar? Enfim, resolvi arriscar e o segui de bike por uma ribanceira. Chegamos ao local e realmente havia uma propriedade num lugar maravilhoso, tudo cuidado minuciosamente. Pediu-me para aguardá-lo que voltaria logo. Aguardei-o já com o pé no pedal e uma marcha boa para sair dali voando, caso algo de errado acontecesse. De repente, apareceram três monges beneditinos e um grupo de freiras. Um dia monges era brasileiro, de São Paulo, e depois de trocarmos ideias, convidou-me para uma reza. Estacionei a bike, levaram-me para dentro de um salão com uma mesa de centro e uma cruz. Deram-me uma bíblia e começaram a pregar por Nossa Senhora. Sentei na última fileira e foram uns quinze minutos intensos de levanta e abaixo e rezas em dinamarquês e latim. Travei! Não conseguia ver lógica no que acontecia, meus olhos não piscavam, senti calafrios e voltei a lembrar de minha mãe; comecei a chorar. Sabia que tinha uma explicação da razão de estar lá, por ela. Senti minha mãe perto e voltar a ter esse carinho de mãe é uma das coisas mais maravilhosas do mundo. A missa acabou, os beneditinos acompanharam-me à saída. Troquei breves palavras, despediram-se e se foram. Procurei pelo homem que me levou lá e não o achei. Não havia mais nada a fazer, fui lá para senti-la? Subi na bike para continuar viagem, não sem antes olhar para trás e admirar o monastério e a beleza daquele lugar. Subi a colina de acesso à rua chorando e pedalando; voltar a ter um pouquinho do amor de mãe, do carinho, do cafuné que sempre tive, foi uma benção para mim. Não há lugar, não há tempo, ela escolherá quando é o melhor momento a nos reencontramos. A mim, basta aceitar, esperar e amá-la como sempre a amei.


Foi nesse estado de espírito que terminei minha rota na cidade de Helsingør na Dinamarca. Em completo estado de êxtase, confuso com a proximidade da troca de país, resolvi passar mais uma noite aqui. Assim, achei um camping, perto do mar, de onde pudesse sentir os últimos momentos nesse solo dinamarquês tão especial.


Talvez esperasse muito de Copenhagen; criamos muitas expectativas. Jamais imaginaria que nessa trajetória dita científica do Projeto Giraventura, encontraria na Dinamarca um anjo, Bugsy, ou um homem esquisito que me levaria a um lugar sagrado. Jamais imaginaria que na terra que Hamlet viu seu pai, eu reencontraria a minha mãe. O que de científico tem isso?


Sei que a fase científica está só no seu segundo ano, mas já tentando mostrar-me que o caminho escolhido, mesmo sendo científico e mais racional, também abre-nos outras portas laterais. Essas, de carinho, amor e compreensão. Obrigado por tudo Dinamarca, às vezes penso e me bate medo de lhe deixar para trás.


Quando não se tem mãe, parece que falta um pedaço de você. Em uma experiência que me exponho, tentando ter o mínimo para viver, hoje, ganhei um pouquinho da minha mãe. Estou feliz! Eu te amo minha linda, eterna e presente mãe Eny.

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