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BR 153, COLINAS, GUARAÍ, MIRANORTE, TO - ETAPA 2020, DO OIAPOQUE AO CHUÍ DE BIKE

Atualizado: 13 de ago. de 2021


A velocidade que as coisas acontecem é impressionante. Por mais planejado que esteja, as decisões são tomadas minutos antes da partida. Condição física, psicológica, alimentar, o que vou encontrar pelo caminho? Essas são algumas variáveis que tenho que lidar na equação que também leva uma constante, o calor. Ah, esse se pode contar.

A partir das 6h, o sol nasce. Nasce lindo em um horizonte vermelho a perder de vista. Singelamente ele dá as caras, vai subindo aos poucos em um céu azul com pouquíssimas nuvens. Com ele, a temperatura cresce gradualmente; começa nos 28 graus logo cedo, 32, 35, 40, 45 e atinge 50 graus por volta das 12h. O ar seco sufoca e não há água que dê conta.

Minha hidratação começa pela manhã, antes de partir. Procuro tomar muita água durante a noite, durmo com uma garrafa ao lado. De manhã, nos pequenos hotéis espalhados ao longo da rodovia, pelo menos suco há. Tomo muito, com meio comprimido de Clorin a cada litro. Parto carregando um isotônico e 1,5 litro de água.


Nem sempre há vida na BR. Carretas passam ao meu lado, as vezes em sequência, dando aquele golpe de ar quente que muitas vezes me ajuda morro acima. Aos poucos, aparecem algumas comunidades, vendedores ambulantes de caldo de cana ou senhoras sozinhas vendendo frutas. Trechos interditados para obra na BR fazem-me ter o prazer de ter a rodovia federal por quilômetros e quilômetros para uma bike, a minha.

Minha média de pedalar 80 km a 90 km por dia se cumpre com uma parada estratégica na sua metade. Hora de comer e repor todo o líquido que já consumi na primeira parte da etapa.


Quando pedalei de Araguaína a Colinas estava exausto nos últimos 10 km, afinal foram 109 km nesse dia. Nesse dia, encontrei uma vendinha de meio de estrada e não hesitei. Vi um isopor cheio de caju com gelo. O homem achou que fosse comprar o caju, mas não. Pedi os pedaços de gelo e aos poucos fui os colocando dentro do bretelle. Enchi de cacos de gelo costas, peito e pernas; aliviou.

Personagens surgem o tempo todo. Desde um ciclista em sentido inverso que saíra do Uruguai e seguia a Fortaleza, a homens e mulheres andando sem sacola, sem nada, embaixo de um sol de 50 graus. Cruzei ciclistas, sempre algum louco treinando pela BR como o Ivo, que fez questão que desviasse meu caminho para apresentar a sua cidade, a pequena Nova Olinda. Cruzo também pessoas de carro, que encostam no acostamento, param-me e perguntam da minha história. Um deles, um motorista de uma caminhonete de Palmas, deu-me R$ 50,00. “Rapaz, o mínimo que faço depois de ouvir isso é pagar teu almoço!”.

Fico em hotéis de beira de estrada, não há muita opção. Alguns, como o que fiquei em Guaraí, com colchão rente ao estrado e travesseiros de dois dedos. Entretanto, uma exigência minha em todas as acomodações, ar-condicionado. Impossível viver sem ele por essas redondezas.

Há horas que fico saturado da rotina desses hotéis, da comida de restaurantes de estrada. Tenho comido pouco, fico receoso de passar mal.


Hoje, cheguei a Miranorte. Estava em contato com uma ciclista que residia aqui. Seu filho Pedro, que se diz meu fã, pediu à mãe que abrisse a porta da casa dela para me receber.

Cheguei a Miranorte exausto. Fazia 49 graus quando parei no local combinado e aguardei ser resgatado pelo pai de Pedro. Buscou-me de moto e fui o seguindo até uma casa térrea cidade adentro. Sua esposa aguardava-me para o almoço. Preparam um quarto para mim, nem minha roupa deixaram-me lavar. Tomei um banho de ducha no quintal, almocei e deitei na rede. Confesso que estava precisando desse chamego.


Não é fácil estar só. Concentrar para sua vida em um único propósito, sobreviver nesse calorão sem cair duro no meio da BR.

Toda noite, horas antes da próxima etapa, fico tenso do que encontrarei. Escrevi em um post hoje: “tudo é uma questão de adaptação, se você tem o mínimo de noção onde pisará”. Aos poucos, a dura adaptação ao clima vai tomando parte da sua rotina. Não há como negar que o planeta esquenta a cada dia e que cabe a nós saber lidar com essa quentura, não fugir dela. Não há como fugir do construímos em gerações.

Meu corpo e mente se acostumaram ao que não é aparentemente normal. Mas a vida é assim, uma série de adaptações todo dia, independente do que nosso ímpeto e orgulho de planejar e prever o futuro.


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